Água 

Produto consumido nas residências, nas empresas e em locais públicos continua sendo descartado, embora pudesse ser reutilizado na irrigação de plantas, limpeza urbana e descargas sanitárias, que não exigem o líquido potável.

Um conflito de interesses financeiros e ambientais retarda a proliferação de sistemas para o reaproveitamento da água consumida em residências, locais públicos e indústrias, afirmam especialistas. De acordo com eles, iniciativas de reuso têm dado lugar a projetos de captação em fontes novas e distantes dos locais de abastecimento. E a água tratada, que poderia ser destinada unicamente ao consumo humano, continua a servir a atividades que não exigem líquido potável – irrigação de plantas, limpeza urbana, descargas sanitárias.

A expansão do reuso é uma medida necessária e urgente, a julgar pelo que diz o engenheiro civil Plínio Tomaz, coordenador da Comissão Especial de Meio Ambiente do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de São Paulo (Crea). Segundo ele, a Organização das Nações Unidas (ONU) considera crítica uma oferta anual inferior a 1.200 metros cúbicos de água por habitante. Na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), está em 201.

“Já estamos em crise, e isso afeta a região de vocês”, declarou Tomaz, ao se referir à Baixada Santista, parcialmente abastecida pelo Sistema Billings, que desvia recursos hídricos do Alto do Tietê e de outras bacias hidrográficas.

O diretor do Centro Internacional de Referência em Reuso da Água (Cirra), da Universidade de São Paulo (USP), Ivanildo Hespanhol, declarou que testes feitos pela instituição em cerca de dez indústrias paulistas comprovam economia de até 90% no valor do metro cúbico (mil litros), em decorrência da reutilização. Além da água tratada ser aproveitada mais vezes em tarefas produtivas, o lançamento de resíduos na rede coletora de esgoto diminui.

“As companhias de saneamento não vão fazer reuso (em larga escala)”, entende Hespanhol, porque “terão uma perda de receita insustentável”. Por exemplo, para a Prefeitura de São Paulo, o metro cúbico da água tratada custa R$7,00. O da água de reuso, R$0,44.

Essa, porém, não é a preocupação do setor industrial: mais do que isso, o pressiona uma “agenda internacional” em que se defende a preservação do ambiente e a proteção de mananciais. Assim, para apresentar boa imagem ao mundo, indústrias investem no reaproveitamento a fim de evitar “perda de competitividade”.

Potencial
Por tabela, as indústrias que aderissem ao reuso ajudariam empresas como a Sabesp a poupar esforços e recursos. O diretor do Cirra também professor do Departamento de Hidráulica e Sanitária da Escola Politécnica da USP (Poli/USP) – calculou que a produção de água varia de 68 a 72 metros cúbicos por segundo, na RMSP. Em indústrias que aplicaram em sistemas voltados a essa finalidade (Volkswagen, 3M, Continental, Alpargatas), recuperam-se de 40% a 80% da água consumida.

O potencial de reaproveitamento se traduz no fato de que, conforme números da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) citados por Hespanhol, há 8 mil indústrias de médio e grande portes no território paulista, capazes de direcionar “um grande nível de investimento” em tratamento para novas utilizações.

Na Baixada Santista, um exemplo de reuso é a Cosipa, em Cubatão, que construiu 16 sistemas de resfriamento e recirculação da água utilizada na fabricação de aço, pelos quais passam 60 mil metros cúbicos de água por hora – 96% do líquido que serve ao processo industrial são reaproveitados.

O maior complexo é o do Sistema de Tratamento e Recirculação de Água das Laminações, com três estações, por onde passam cerca de 6 mil metros cúbicos/hora e no qual se investiram US$40 milhões (em torno de R$86 milhões), segundo o setor de Comunicação da siderúrgica.

Apenas seis cidades paulistas dispõem do serviço
Apesar de a Sabesp ter iniciado a distribuição de água de reuso em 1998, apenas seis das 367 cidades atendidas pela companhia, no Estado, dispõem desse serviço: Barueri, Carapicuíba, Diadema, Santo André, São Caetano do Sul e São Paulo. E não há projetos para a ampliação do sistema e outras regiões, segundo a analista de Marketing do Departamento de Planejamento e Controladoria da Sabesp na Região Metropolitana de São Paulo, Eliane Flório.

Por mês, distribuem-se em torno de 22 milhões de litros (ou 22 mil metros cúbicos) de água reaproveitada a esses municípios. O volume equivale a pouco mais de cinco minutos de abastecimento de água potável para a Região Metropolitana de São Paulo, estimado entre 68 e 72 metros cúbicos (68 mil a 72 mil litros) por segundo.

A quantidade ainda corresponde a 0,01% do consumo mensal estimado de água tratada (mais de 180 milhões de metros cúbicos, ou 180 bilhões de litros) nesses 39 municípios – que poderia encher quase 1.650 vezes o Reservatório Santa Terezinha/Voturuá, entre Santos e São Vicente, com capacidade aproximada para 110 milhões de litros de água.

“Ao se fazer 40% de reuso de 70 metros cúbicos, são 28 metros cúbicos a menos (de água tratada utilizada)”, comparou o professor Ivanildo Hespanhol, da Poli/USP, com base no reaproveitamento mínimo alcançado por indústrias que adotaram o reuso.

Com isso, seria desnecessário recorrer a um projeto debatido há, aproximadamente, 20 anos: a adução do rio Juquiá, que deságua no Rio Ribeira de Iguape, no Vale do Ribeira, para atender a demandas futuras da RMSP – que, como se calcula, poderão chegar a 100 metros cúbicos por segundo na próxima década ou na seguinte.

Demanda
Por se saber há décadas que o abastecimento da RMSP e de outras localidades precisará de reforços e do quanto se poderia chegar em termos de reuso da água, por que o reaproveitamento é tão incipiente?

“Há limites de geografia. A logística necessária torna o processo (de distribuição da água reaproveitada) mais difícil e encarece o produto”, explicou Eliane Florido, a respeito da distância entre diferentes partes do Estado e as estações de tratamento de esgotos da RMSP que preparam resíduos para reuso.

A maior parte da água reutilizável é distribuída por meio de caminhões-pipa, e o custo do transporte é por conta do cliente. Desde 1998, a empresa Linhas Corrente, da RMSP, a recebe de forma encanada e paga em torno de R$0,78 por metro cúbico. Essa água serve para tingimento. A mesma quantidade de água potável sai por R$9,34, quando o consumo mensal supera 50 metros cúbicos.

A Assessoria de Imprensa da Unidade de Negócios da Sabesp na Baixada Santista informou que, na região, “não temos demanda” por água de reuso – cuja existência, entretanto, não é divulgada insistentemente. “Mas o Poder Público pode dar o exemplo, ao iniciar um trabalho desse tipo”, sugere Eliane Flório, como forma de estimular eventuais consumidores.

Prefeitura adotará sistema
Por “ordem do prefeito” João Paulo Tavares Papa (PMDB), os projetos de edificações da Prefeitura deverão prever a existência de sistemas para reuso da água de lavatórios, bebedouros e da chuva. A afirmação é do secretário municipal de Meio Ambiente, Flávio Rodrigues Corrêa, que neste ano enviou ofícios à prodesan e à Secretaria de Obras e Serviços Públicos com a idéia, transformada em “determinação” recentemente, segundo ele.

“Temos uma série de escolas a serem construídas”, declarou Corrêa, sem incluir os novos colégios que já estão em construção entre os que deverão conter sistemas para reaproveitamento de água. Os editais de licitação para obras deverão conter sistemas para reaproveitamento de água. Os editais de licitação para futuras obras deverão conter a exigência de que as empreiteiras interessadas providenciem sua execução.

Numa explicação simplificada, Corrêa disse que a água para reuso será separada em uma caixa e bombeada para outro reservatório, de água não potável. Ali, passará por tratamento e terá como destino o reaproveitamento em descargas sanitárias, lavagem de pisos e irrigação de plantas. “Teremos uma conta menor, tanto com a Sabesp quanto com a Natureza”.

Chuveirinhos
O projeto de reutilização da água dos 176 chuveirinhos da orla – apresentado em 2003, aprovado pelo Comitê da Bacia Hidrográfica da Baixada Santista (CBH – BS) e suspenso depois que Papa assumiu o Executivo – “vai ser feito”, mas depende de reavaliação. E o ponto de partida será a instalação de um chuveiro no Jardim Botânico Chico Mendes, no Bom Retiro, do qual a água utilizada será destinada a análises no laboratório municipal do Posto 3, no Gonzaga.

Flávio Corrêa espera que o novo chuveiro comece a funcionar neste mês. Para ele, o período de verão ajudará a dimensionar o consumo de água e indicar os equipamentos necessários, proporcionalmente, ao reuso nos equipamentos das praias.

Haverá coletas semanais de água para avaliação. Em cerca de seis meses, deverão surgir os resultados do monitoramento, e o projeto será reapresentado ao Fundo Estadual de Recursos Hídricos (Fehidro) para financiamento.

O original tinha custo estimado em R$519.650,00, metade dele pago pelo Fehidro e os demais 50%, pelo Município. Em torno de 120 milhões de litros de água poderiam ser reutilizados, anualmente.

Irrigação das áreas cultivadas terá preço reduzido
Especialistas trabalham no preparo de uma legislação específica sobre o reuso da água na agricultura, que deve estar concluído em meados de 2007. De acordo com o diretor do Centro Internacional de Referência em Reuso da Água (Cirra), da Universidade de São Paulo (USP), Ivanildo Hespanhol, a medida é necessária porque “70% da água consumida no Brasil” se destinam a essa finalidade.

Além de tornar a irrigação de áreas cultivadas mais barata e de se poupar água potável para consumo humano, o líquido proveniente do tratamento de esgoto contribuiria para aumentar a produtividade das lavouras. Hespanhol comentou que a água de reuso contém mais matéria orgânica e eleva a capacidade de retenção da água pelo solo.

“È uma questão política e de planejamento. E, para haver uma decisão política, é preciso que haja um instrumento”, mencionou, sobre o texto-base que está em elaboração e que dependeria de aprovação do Congresso e da Presidência da República para se tornar lei.

Outra utilização prevista para a água de reuso é na aqüicultura (criação de peixes), que não demanda líquido potável. “Os mananciais ficariam mais protegidos”.

A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) também deverá preparar a minuta de um regulamento para o reuso, segundo Plínio Tomaz. “As descargas sanitárias correspondem a 35% do consumo de uma casa. A gray water (água cinza) poderia ser usada também em lavagens de pátios e roupas”.

(Fonte: Veiculado no Jornal A Tribuna de Santos, em 12/12/2006)

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