Sempre que se fala em recursos hídricos, a primeira coisa que vem à mente das pessoas são os rios, córregos e lagos, as chamadas águas superficiais. Mas a escassez do produto está mudando essa visão. Hoje, em vários países, a água se desdobra em quatro fontes principais: a superficial, as subterrâneas, a de chuva e o reuso.

"Essa é uma nova realidade, uma mudança de mentalidade que ganha cada vez mais força, principalmente no continente europeu e no norte da América", afirma o engenheiro Plínio Tomaz, autor da norma brasileira para captação de água de chuva, em vigor desde setembro do ano passado.

Segundo Tomaz, essas quatro fontes são hoje "o novo paradigma da água para o século 21". Para ele, esse é o caminho que várias regiões brasileiras terão que adotar em curto prazo. Como exemplo, ele cita a Região Metropolitana de São Paulo.

A ONU recomenda que a disponibilidade hídrica de uma região seja de 1.200 m3 por pessoa (1,2 milhão de litros). Na Grande São Paulo, esse volume é hoje de 201 m3. Ou seja, mais de 50% da água consumida nessa Região Metropolitana vem de fora, até de Minas Gerais. E isso só vai piorar. O próximo passo será captar água do rio Ribeira de Iguape".

Dificuldades
O problema, segundo ele, é que como as distribuidoras de água no País não lucram nem com o reuso e nem com a captação da água de chuva, não haveria interesse em incentivar essas alternativas.

"Na Alemanha, onde a meta é economizar 15% da demanda até 2015 só com a captação de água de chuva, há inúmeros incentivos. Lá, o governo paga ao cidadão US$ 2,5 mil para ele instalar uma cisterna. Nos Estados Unidos, quem usa água de chuva tem desconto na fatura. Aqui é o contrário, ou seja, você é taxado". 

Tomaz conta o caso de um posto de combustível no bairro de Picanço, em Guarulhos, para dar uma idéia da economia que se obtém com a utilização da água da chuva. "De R$ 1,2 mil que era o custo mensal, caiu para R$ 90,00 o gasto com a água graças ao aproveitamento da chuva".

Para o especialista, os postos, supermercados, hospitais, escolas, teatros e similares são os locais mais propícios para instalar esse tipo de projeto.

"A área de captação ideal é acima de 250 metros quadrados. Abaixo disso o retorno financeiro fica comprometido. Porém, do ponto de vista ambiental, aproveitar a água de chuva para fins não-potáveis é fundamental. Lá fora eles já entenderam essa equação. Aqui, estamos evoluindo, mas de forma lenta".

Alerta aos interessados
Quem quiser construir um sistema de captação de água de chuva deve seguir a Norma Brasileira número 15.527, do contrário, pode enfrentar problemas jurídicos. O alerta é do professor Plínio Tomaz, coordenador nacional dos estudos. "A norma é uma recomendação. O seu uso não é obrigatório. Porém, se houver um problema e isso gerar uma ação na Justiça, o juiz irá usar a norma para saber se o projeto foi bem feito. Nesse caso, quem não estiver dentro dos parâmetros estabelecidos, poderá enfrentar problemas".  Criada em setembro de 2007, ela dispõe de todas as informações técnicas para a implantação do sistema. A norma pode ser consultada no endereço  www.abntnet.com.br.

Lei pode impedir reuso e reaproveitamento
Uma decisão a ser tomada nos próximos dias pelo Governo Federal pode trazer enormes dores de cabeça para quem hoje se utiliza de poços artesianos ou faz captação de água de chuva.

O alerta é do presidente da Associação Brasileira de Águas Subterrâneas (ABAS), o hidrogeólogo Everton de Oliveira.

Segundo ele, a Lei de Saneamento (11.445), que está sendo regulamentada pela Secretaria Nacional de Saneamento prevê, no parágrafo 2 do artigo 45 que toda edificação predial ligada a rede de abastecimento não pode utilizar outras fontes de captação. "É inacreditável, mas é verdade", afirma Oliveira.

Em Campinas, segundo ele, poços artesianos já estão sendo lacrados. No Rio Grande do Sul, a promotoria pública já não permite mais novas obras.

"Entramos, por meio da Abas, com um parecer junto ao governo para que as fontes alternativas de água não sejam proibidas. Conseguimos mobilizar os grandes consumidores, mas é muito difícil fazer isso com os pequenos".

Clandestinos
Hoje, segundo Oliveira, cerca de 50% dos municípios paulistas já são inteiramente abastecidos com água subterrâneas. O índice sobe para 75% quando se analisam as cidades que usam tanto os recursos superficiais como os poços.

"Só na cidade de São Paulo, mais de 70% dessa captação subterrânea não é regulamenta. Para você ter uma idéia, isso representa um volume superior a todo o Sistema Cantareira, a principal fonte de água potável da maior cidade do País".

Na Baixada Santista, o presidente da Abas afirma que o uso de água por meio da perfuração de poços é intensa. "A região se caracteriza por aquiferos rasos, muito acessíveis, o que facilita a coleta, principalmente para fins não-potáveis, inclusive nos morros".

Oliveira salienta, porém, que quanto mais próximo do mar, maior será a intrusão salina, ou seja, a entrada de água salgada no poço. "Mas se o sistema for legalizado, o DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica) orienta sobre a melhor forma de uso".

Pequenos grandes exemplos
Dona Cidinha nunca ouviu falar sobre a norma brasileira que regula a construção de sistemas para captação de água de chuva. Mesmo porque, quando decidiu que seu prédio de cinco andares, no Embaré, em Santos, iria ter uma cisterna com esse objetivo, a norma sequer existia.

Isso foi há quatro anos, e ela não tem do que se arrepender. O seu pioneirismo vem sendo recompensado com uma economia que ela estima ser, em média, de R$ 200,00 a cada mês na fatura de água.

"Eu fico desesperada com tanto desperdício, revoltada mesmo. Por isso implantei a captação de água de chuva no meu condomínio", explica.

Com o recurso, que fica estocado em caixa de 500 litros, dona Cidinha diz ser possível limpar toda a área comum do edifício e ainda regar os jardins. "São cerca de 2 mil litros que economizamos nesse processo", contabiliza.

Na época, ela afirma que foram gastos cerca de R$ 400,00, com canos, válvulas e mão-de-obra. "A caixa eu já tinha. O sistema deu tão certo que fui visitada por vários interessados. Até estudantes universitários estiveram aqui", relata, orgulhosa.

Grandes obras
Já para o professor de arquitetura, urbanismo e engenharia civil da Universidade Santa Cecília (Unisanta) Francisco José Carol, a opção pela água de chuva faz parte de uma filosofia implantada há anos em seus projetos.

Hoje, o professor Carol é responsável pelas maiores obras do gênero na região. É dele, por exemplo, o projeto em um grande supermercado em São Vicente, de uma escola na Ponta da Praia e do Portal Vila Rica, o prédio da falida construtora Encol, no Canal 3, em Santos.

No caso do hipermercado vicentino, as cisternas não só economizam água, como ainda funcionam como chr39piscinõeschr39 que retêm parte da água da chuva, diminuindo o risco de enchentes naquela região.

Já no condomínio do Gonzaga, o arquiteto projetou um sistema capaz de armazenar até 8 mil litros, além de um poço para captação de água subterrânea.

"Isso deveria ser lei, não só a água da chuva e os poços, mas as calçadas dotadas de áreas verdes para escoamento da chuva e o asfalto ecológico, que permite uma maior absorção de água".

Para o arquiteto, essas e outras alternativas que visam o uso racional dos recursos hídricos são sinônimos de comprometimento com o futuro. "O benefício obtido é para todos. Trabalhar com esse conceito é garantir, na prática, a qualidade de vida das futuras gerações".

(Fonte: Veiculado no Jornal A Tribuna de Santos, em 17/03/2008)

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