Fenômeno é agravado por expansão de prédios em bairros, megaconjuntos residenciais que passam pela CET quase triplicaram.

Virou lugar-comum a reclamação de que, no trânsito de São Paulo, são raras as opções para escapar dos engarrafamentos, que vão dos grandes corredores às vias menores.

Mas há um grupo de paulistanos para quem nem sequer existe esse dilema de ir por aqui ou por ali. Eles vivem ou trabalham num beco sem saída. As longas filas de carros chegam à porta da casa ou do escritório. Às vezes, até dentro.
"Já peguei trânsito inclusive no quinto subsolo da garagem para sair para a rua. Fiquei 15 minutos esperando. Daqui a pouco, vai ter marronzinho no estacionamento", afirma o administrador Alan Falkas, 33.

Devido ao congestionamento diante do trabalho, na Vila Olímpia, ele já levou mais de meia hora "só para fazer meia volta no quarteirão". Costuma perder 50 minutos nos quatro quilômetros da volta para casa, no Brooklin (zona sul). A pé, se deslocaria com mais rapidez.

"Quando engarrafa a marginal [Tietê], aqui também pára, pode levar cinco minutos para sair do condomínio. Vou 15 minutos mais cedo para evitar surpresas", conta a professora Maria Alice da Silveira, 48, moradora de um conjunto de prédios com 4.000 pessoas na Casa Verde (zona norte).

O fenômeno do trânsito que inviabiliza a circulação em pequenos quarteirões e afeta até as garagens tem boa parte de seus ingredientes no boom imobiliário que superlotou bairros paulistanos com infra-estrutura viária incompatível.

Ele foi agravado pela expansão de empreendimentos comerciais com estacionamento para mais de 200 veículos e principalmente residenciais com mais de 500 vagas que são denominados pólos geradores de tráfego pela legislação municipal.

De 1989 a 2002, a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) analisava seis megaconjuntos para morar e 14 para trabalhar por ano em São Paulo. De 2003 para cá, foram 17 de cada anualmente um total de 34.

Porteiros viram ‘marronzinhos’ para ajudar motoristas a sair
Na zona leste, até semáforo já existe do Projeto Viver – que concentra 7.000 pessoas, mas por ser direcionado aos pedestres, o sinal é insuficiente para assegurar a fluidez e segurança na saída para a Avenida Celso Garcia.

Na disputa para conseguir entrar na via, moradores já contabilizam mais de 15 acidentes em cinco anos. “É trânsito direto. A gente só consegue atravessar quando fecha o (semáforo). É duro perder cinco minutos só para sair do estacionamento”, reclama o estudante Alessandro de Moraes,34, que no ano passado foi atingido por um ônibus na entrada do Projeto Viver.

Pelo portão do Condomínio gigante só passa um veículo por vez, para entrar ou sair. O alívio são os porteiros, como Maílson, Emerson ou Mazinho, que cumprem suas funções como se fossem marronzinhos (como são chamados os agentes) da CET. Braços erguidos pra cá, assobio pra lá, tentam minimizar os problemas do trânsito. “O pior é ter que agüentar os xingamentos”, conta Maílson.

Na Vila Cordeiro, na zona sul, a moradora Maria Augusta Pereira, 48, reclama de problema semelhante : “Meu pai, que tem 74 anos, tem dificuldade para tirar seu carro da garagem. O trânsito é tão intenso, que é preciso esperar a boa vontade de alguém”, conta ela, saudosa de tranqüilidade do bairro residencial anos atrás.

Brecha
Na Rua João Moura, no Jardim das Bandeiras (zona oeste de SP), contar com a ajuda de alguém também é comum.

“É trânsito para entrar e para sair. Às vezes, fico cinco minutos para conseguir uma brecha, mas a sensação é de uma hora e meia. De manhã, só saio com ajuda: um vigia de rua faz a função de marronzinho”, conta o arquiteto Caio Machado, 52.

Machado é o retrato de uma situação cada vez mais comum: ter  uma garagem dentro de casa não é nenhuma garantia de que você conseguirá utilizá-la para estacionar seu carro.

Essa faceta curiosa, provocada pelo trânsito de São Paulo, já afetou a rotina de Machado.

No final da tarde de dias congestionados, não é incomum ele deixar seu automóvel na rua e caminhar a pé até a sua casa. Motivo: devido ao intenso tráfego de passagem, “é impossível conseguir manobrar” e estacionar dentro da garagem.

CET não tem poder para vetar novos prédios
Só passam por análise da companhia edifícios comerciais com mais de 200 vagas de garagem e residenciais com mais de 500. Deficiências na forma de aprovação de conjuntos residenciais ou comerciais contribuem para afetar trânsito, dizem especialistas.

O mais moderno empreendimento residencial é lançado no bairro da moda, as centenas de apartamentos são vendidas em horas ou dias, as torres são aprovadas, erguidas e entregues a toque de caixa, sem obstáculos na Prefeitura, os novos proprietários são só felicidade. 

Mas a insatisfação começa quando a rotina se repete no terreno de um lado, depois no do outro, depois no da frente. 

E, nas palavras da urbanista Regina Monteiro, diretora da Emurb (Empresa Municipal de Urbanização), os moradores passam a conviver com os transtornos na vizinhança -trânsito, barulho- provocados pelas mesmas facilidades na liberação dos imóveis que os beneficiaram tempos atrás. 

"O empreendimento vira refém do trânsito que ele mesmo ajudou a criar e também vira refém da própria maluquice de permitir a verticalização sem tantos critérios", afirma. 

Especialistas ouvidos pela Folha avaliam que há deficiências na forma de aprovação de conjuntos residenciais ou comerciais em São Paulo e que esse é um dos motivos que ajudam a entupir alguns quarteirões e a afetar até as garagens.

Na Vila Olímpia, ao mesmo tempo em que pipocam reclamações de engarrafamentos, ainda há obras ao redor que vão adensar mais ainda a região.

"Está péssimo. Tem as obras, e a região não suporta tantos prédios comerciais. Todos os estacionamentos aqui estão lotados", lamenta-se Renata Cristina de Abreu, analista de tecnologia da informação.

Hoje, com base na legislação municipal dos pólos geradores de tráfego, só passam por análise de impacto na CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) edifícios comerciais com mais de 200 vagas de garagem e residenciais com mais de 500. 

A instalação desses empreendimentos, desde que de acordo com as regras de zoneamento, nunca são vetadas pelo órgão, que só tem a atribuição de definir medidas mitigadoras do seu impacto, como a instalação de semáforos ou de câmeras de monitoramento. 

Além disso, diversos prédios de médio porte concentrados uns ao lado dos outros podem ter reflexos ainda maiores na vizinhança e não são alvos nem desse tipo de análise. 

"Se juntar todos numa mesma rua, fica até pior do que um condomínio grande. Hoje em dia, só não é pior porque as pessoas já começam a mudar seus hábitos", avalia Luis Antonio Seraphim, especialista em trânsito e ex-assessor da CET. 

Lucimeire Feliciano, que trabalha na Vila Olímpia, costuma adiar a volta a casa por duas horas e aproveita para trabalhar um pouco mais ou para ir papear com as amigas na padaria da esquina. "Antes eu aproveitava que tinha manicure aqui por perto. Agora estou vendo massagem e academia." 

Marcelo Manhaes de Almeida, presidente da comissão de direito urbanístico da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil), acha que os impactos dos novos empreendimentos deveriam ser analisados como um todo. "Fica uma lacuna. Tudo deveria ser avaliado com base em uma fotografia geral, e não de forma pontual", diz. 

"A visão atual é míope, medíocre", reforça Antonio Fernando Pinheiro Pedro, especialista em direito ambiental, para quem a prefeitura já poderia barrar empreendimentos nocivos à vizinhança com base em conceitos constitucionais e do próprio Estatuto da Cidade. 

A CET admite que a avaliação feita é "particularizada", mas alega que faz projeções futuras, embora sem considerar empreendimentos não construídos -sob a alegação de que poderia superestimar as estimativas de impacto no tráfego. 

(Fonte: Veiculado no Jornal Folha de São Paulo, em 16/03/2008)

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