FERNANDO DE SANTIS
DA REDAÇÃO

Jorge Benjor brincava com Tim Maia falando que ele era um dos condôminos mais invocados que o Rio de Janeiro já conheceu. Um calo nos pés do seu síndico:
 “(...)Tira essa escada daí Essa escada é prá ficar aqui fora Eu vou chamar osíndico (...)”

Vizinhos como o adorável maluco já falecido, Tim Maia, devem realmente ser um problema para os ‘normais’ que vivem na parede ao lado. Notívago, de voz poderosa mesmo sussurrando e afeito a festas animadas, Tim fazia a vizinhança delirar. Mas não de prazer, como diz seu biógrafo, Nelson Mota.

Rubens Moscatelli, presidente do Sindicato dos Condomínios Prediais do Litoral de São Paulo, afirma que se não fossem os ‘Cs’, a vida em condomínio seria quase um jardim de tulipas. Mas aí entram as ‘C’rianças barulhentas, os ‘C’arros mal estacionados, os ‘C’anos furados, os ‘C’achorros com donos mal adestrados e os ‘C’alotes nas taxas condominiais para dar aos síndicos motivos para a insônia.

MALDITO BARULHO
Moscatelli, como síndico, ouve muito por causa do barulho. Crianças brincando à noite com bolas ou brinquedos que teimam em cair no chão. Reclamações sobre o ruído do sapato das mulheres.

Uma das histórias de desrespeito ao sossego que acompanhou esta, na qualidade de vizinho - ilustra a delicadeza da questão: “No prédio onde eu morava, havia um casal - ele com 56 anos, ela com algo por volta de 80. O problema é que ela era muito barulhenta ao fazer amor. E eles faziam várias vezes ao dia, à noite e de madrugada. Até os vizinhos do prédio em frente reclamavam”. De acordo com Moscatelli, o síndico chegou a multar o casal várias vezes, apesar de não  constar uma regra específica  sobre ‘ruídos amorosos’ na convenção  condominial (o documento que regula a relação entre os condôminos num mesmo prédio). “A situação só se  resolveu quando a senhora barulhenta faleceu”. 

ATÉ ARARA
Marcelino Rodrigues, leitor de A Tribuna, comentou no endereço  eletrônico do jornal que acha comum aguentar cachorros que ficam se esgoelando porque os donos saíram para passear. Para ele, a provação é ficar aguentando uma arara que começa a gritar às 8 horas da manhã de domingo - quando não, o dono assobia para atiçar o bichinho.

Outro leitor que se sente vítima do desrespeito é Adriano Savinas, morador do andar térreo de um edifício em São Vicente. Há tempos ele vê chover em seu quintal bitucas de cigarros, pastilhas do revestimento do prédio, seringas descartáveis, camisinhas e outros objetos. Mas foi recentemente que sentiu que sua vida - e a do filho, que mora com ele - estava em risco. Caiu uma placa de vidro em cima do seu telhado. E a encrenca continua, com o vazamento no apartamento ao lado. Parte da prospecção para encontrar o vazamento foi feita por sua parede. Mas como não encontraram o cano que deixa passar a água, sobraram para Adriano as infiltrações, um buraco na parede e a conta de um serviço que, segundo ele, não é de sua responsabilidade.

Para o sindicalista Moscatelli, de 60 a 70% dos problemas de relacionamento em um condominio poderiam ser resolvido na base da aplicação do bom senso. “Não fazer aos outros o que não quero que façam contra mim”. Mas o senso comum não é tão frequente e alguns condôminos continuam enchendo a casa de animais mal educados, parando carros em locais errados, fazendo barulho em hora errada e violando outras normas elementares de educação e conduta. 

NOVOS SÃO MAIS BARULHENTOS
O síndico profissional Moisés dos Santos Abreu, responsável pela administração de aproximadamente mil apartamentos, comenta que as paredes mais finas dos prédios mais novos tornam a situação pior. Ele afirma que tem por clientes aproximadamente mil famílias em vários condomínios. As reclamações sobre barulho são as mais ruidosas em seu escritório.

Os ouvidos de Neuza Madalena Laragnoit de Martino são testemunhas de sua cruzada contra a falta de bom senso da vizinha. Segundo ela, a vizinha com que divide a parede deixa a televisão alta durante a madrugada. Isso não é nada confortável para quem tem de sair de casa rumo ao trabalho às 6 horas. Ela é chamada de louca pela senhora ruidosa, por uma atitude de reação: “De vez em sempre, bato na parede para ver se ela se toca”, confessa. Como se a televisão não bastasse, Neuza se queixa também de outra ‘bizarrice’ da ‘vizinha coruja’: “Ela faz cooper  nos corredores do prédio de madrugada. Já a ouvi correndo até por volta da 1 hora e 30 minutos da manhã”. Mesmo morando a 50 metros da praia, ela escolhe o corredor nas primeiras horas do dia. A síndica chegou a mover uma ação, mas a causa morreu na praia.

CARINHO,COMPREENSÃO E CHICOTE
Affonso Celso Prazeres de Oliveira, o síndico do Edifício Copan, o condomínio mais populoso da América Latina, no Centro de São Paulo, costuma dizer que conseguiu construir um bom convívio entre os mais de cinco mil moradores do prédio usando os ensinamentos do psicólogo construtivista Jean Piaget. “Eu converso, aconselho, negocio. Mas quando a coisa não funciona, deixo o método Piaget de lado e uso a técnica Pinochet mesmo”, brinca. 

Atitude parecida com a de Affonso – um misto de endurecimento das relações com os inquilinos rebeldes e tratamento carinhoso dos colaboradores e condôminos – trouxe à síndica do condomínio A.D. Moreira, no Gonzaga, Norma Girolano, o carinho dos funcionários,o respeito dos moradores e a multiplicação do valor dos imóveis em 10 vezes nos aproximadamente oito anos desde que ela assumiu a gestão como síndica. “Quando entramos, havia uma série de pendências trabalhistas, problemas graves de infraestrutura e até uma prostituta que atendia seus clientes no prédio. 

Alguns apartamentos chegaram a ser vendidos por R$ 25 mil.Hoje eu  recuseiuma proposta de R$ 250 mil pela compra do meu”, comentado na Norma. Devagar, cobrando na Justiça os inadimplentes, ela foi investindo o dinheiro resultante da penhora dos apartamentos dos devedores na recuperação das colunas de concreto do prédio, em um refeitório para os  28 funcionários, reformas na garagem e na galeria comercial que transpassa o conjunto. 

Agora já começa a orçar a troca de elevadores, substituição das redes elétrica e hidráulica dos conjuntos. “Aprendi com minha avó, italiana, que a honestidade e a seriedade têm de estar em primeiro plano. Eu sou uma das proprietárias. Se deixasse que alguém levasse uma comissão indevida, um desvio de material ou qualquer coisa deste tipo, estaria roubando de mim mesma”, comenta ela,  enquanto na máquina de costura remenda o uniforme de uma funcionária. “Tem de ficar perfeito; não gosto de gente desleixada”.

Aos 75 anos, sentada à maquina, costurando o uniforme e se recuperando de uma cirurgia recente para tratar de umade suas quatro hérnias de disco (um desgaste na coluna), ela dá ordens para um funcionário a quem chama de sobrinho do coração:  “Veja quanto eles querem pelo rolo de fio de bitola 10. Se não encarecer muito, vamos usar o de 16 mm”.

Olha para o repórter e diz que agora se prepara para trocar todo o conjunto de um elevador, a cabine, o cabeamento, o maquinário... Ela olha para o filho, Levy, porteiro em uma das entradas do prédio, e sorri. Ele também, ao vê-la bem humorada. Como mãe, ela é doce;  como patroa, exigente.

Fonte: Jornal ATribuna
Data: 21/10/2012
Caderno: Local A-8
Imagens: Jornal ATribuna

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